Compartilhar prosperidade, uma tecnologia indígena
A aldeia Apiwtxa do povo Ashaninka em Marechal Thaumaturgo, Acre, tem apresentado aos olhos do mundo a capacidade de regeneração de áreas degradadas por atividades como pecuária e exploração madeireira, transformadas em cerca de duas décadas, num espaço produtivo diversificado que garante a subsistência alimentar da comunidade, ao mesmo tempo em que restaura a floresta nativa.
Peixes, mel e frutas diversificadas são produzidas em sistemas agroflorestais, uma técnica relativamente nova, mas que incorpora saberes tradicionais de produção. Mas talvez a maior tecnologia seja não apenas produzir de modo diversificado, mas a capacidade de compartilhar a produção de modo a atender às necessidades de todos.
“Não se trata de dar o peixe ou ensinar a pescar, mas de pescar junto”, diz Francisco Piyãko, liderança Ashaninka e candidato a deputado federal. Com a expressão, Francisco torna explícitos alguns dos fundamentos do modo de ser indígena que agrega o trabalho coletivo e a aprendizagem das novas gerações.
Com a garantia de seus territórios e a liberdade de exercerem seus modos de vida, a prosperidade vem se consolidando entre os Ashaninka da Apiwtxa e a preocupação passou a ser incluir as comunidades vizinhas formadas por ribeirinhos, extrativistas e outros povos indígenas. “Eu não posso estar bem se meu vizinho não está. Estar bem significa que quem está perto de mim também está”, explica Francisco.
Alguns exemplos dessa necessidade de compartilhar os bons resultados com os demais ficam evidentes na iniciativa da Escola da Floresta Yorenka Tatsorentsi, onde a experiência agroflorestal bem-sucedida dos Ashaninka é repassada para moradores de Marechal Thaumaturgo. Mais recentemente, durante a pandemia, a organização Apiwtxa mobilizou recursos próprios e de apoiadores ao redor do mundo para doar kits com alimentos e ferramentas aos moradores do entorno.
Esse olhar voltado ao compartilhamento foi aplicado também por Isaac Piyãko à frente da prefeitura de Marechal Thaumaturgo. O recurso destinado às escolas para merenda escolar vem sendo cada vez mais empregado na compra regionalizada de alimentos, fortalecendo a agricultura e economia local. Com uma visão muito prática e objetiva, Isaac procura estar atento às necessidades locais e buscar soluções realistas para os problemas.
“É preciso estar atento à realidade das pessoas, às vezes podemos encontrar soluções simples e que atendem às suas necessidades”, explica. Agora candidato a deputado estadual, Isaac pretende expandir essas experiências para outros municípios do Acre, sempre respeitando as peculiaridades de cada local.
O técnico agroflorestal Cazuza Borges é um dos que acredita que a experiência Ashaninka possa ser mais bem aproveitada em todo estado, independente das peculiaridades culturais que diferem cada povo indígena e trabalhadores rurais e urbanos.
“O combate à fome é o tipo de pauta que unifica indígenas, trabalhadores rurais e urbanos. Todos estão sentindo a pressão da alta no preço dos alimentos. É preciso trabalhar a segurança alimentar, estimulando a produção regional daquilo que efetivamente vai para a mesa das pessoas: do pobre ou do rico, todos precisam e querem um alimento de qualidade”, explica o técnico agroflorestal Cazuza Borges.