No Acre, grileiros avançam em ameaças à extrativistas na reserva Chico Mendes
Romerito Aquino – Especial para o Mais Brasil News
O avanço da grilagem de terra na Amazônia chegou a tal absurdo que os grileiros agora miram na Reserva Extrativista (Resex) Chico Mendes, a segunda maior do Brasil, com quase um milhão de hectares de floresta, que vem sendo ameaçada no Acre por um exército de grileiros do vizinho Estado de Rondônia, interessado em expulsar as centenas de famílias de seringueiros e castanheiros da região para trocar o extrativismo da borracha e da castanha, praticado há décadas, pela pecuária.
Criada em 1990 com o nome do lider sindical acreano Chico Mendes, que foi assassinado em 1988 por defender a Amazônia e seus habitantes tradicionais, a Resex Chico Mendes, como todas as reservas extrativistas existentes atualmente no país, se destina por lei apenas à prática do extrativismo e de pequenas criações de animais.
Mas agora, os grileiros rondonienses estão pressionando e ameaçando os extrativistas para venderem ou entregarem, por preços aviltantes, as suas áreas de floresta para serem derrubadas e transformadas em pastos para criação de gado, destinado tanto ao mercado interno acreano, quanto para exportação aos mercados vizinhos do Peru e da Bolívia pela Rodovia Interoceânica, que liga o Acre aos portos do Pacífico.
Com o apoio de ambientalistas e dos sindicatos dos trabalhadores rurais dos seis municípios acrianos que formam a grande Resex acreana – Assis Brasil, Brasiléia, Xapuri, Capixaba, Rio Branco e Sena Madureira – os seringueiros e castanheiros estão denunciando aos órgãos de controle do setor as crescentes pressões e ameaças que estão sofrendo por parte dos grileiros.
Os assentados nas colocações da Resex devem pedir a interferência do Ministério Público Federal (MPF) para ajuizar ações contra os grileiros. Além disso, entidades ambientais nacionais e internacionais, como a WWF, estão propensas a fazer denúncias de âmbito internacional contra a ameaça de transformar os 970 mil hectares da segunda maior Resex do país num grande pasto de boi.
“Por enquanto, não temos como avaliar o impacto ambiental, mas temos recebidos muitas denúncias de ameaças aos seringueiros e castanheiros, que manifestam descontentamento com a presença dos invasores na suas colocações”, assinala o chefe do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) da Resex, Fúvio de Souza.
Segundo Souza, as equipes de fiscalização do órgão, vinculado ao Ministério do Meio Ambiente, estão em campo mapeando as áreas desmatadas ilegalmente por grileiros rondonienses nos seringais Paraguaçu, no município de Assis Brasil, e Albacia, no município de Xapuri, terra natal do sindicalista Chico Mendes.
Triste liderança
A Resex Chico Mendes foi destaque na mídia no ano passado por ter sido a unidade de conservação federal mais desmatada e a segunda mais queimada em todo o país. Dados oficiais de desmatamento mostram que os desmates e as queimadas da floresta da Resex explodiram principalmente nos últimos três anos, com o extrativismo das populações tradicionais, para o qual as reservas extrativistas foram criadas, perdendo espaço considerável para a criação de gado.
Tanto o número de queimadas quanto o total de área desmatada na Resex apresentaram tendência de aumento a partir de 2019, primeiro ano da atual gestão federal. Isso se deveu, segundo os seringueiros e castanheiros locais, a retrocessos legislativos, a omissão do poder público e a pressão de setores ruralistas, que passaram a impulsionar as invasões e trazer de volta, de forma muito intensa, os conflitos pela posse da terra, que pareciam ter cessado há quase 30 anos, quando foi criada a reserva.
Entre 2008 e 2018, a média anual de desmatamento na Resex Chico Mendes foi de 1.525 hectares de corte raso dentro da reserva. Mas em 2019 já foram desmatados 7.587 hectares. No ano seguinte, em 2020, a devastação atingiu 5.917 hectares e explodiu de novo, no ano passado, para 8.380 hectares no interior da Resex.
Os números de queimadas dentro da Resex também tiveram aumentos significativos nos últimos três anos, chegando a registrar ao longo de todo o ano passado 1.142 focos de incêndio, que representou 29,2% de todas as queimadas registradas nas unidades de conservação federais existentes na Amazônia Legal.
Os dados oficiais da devastação na Resex Chico Mendes, mostrados por satélites, revelam que entre 2012 e 2018, o número de queimadas no interior da reserva aumentou gradualmente, com uma média de 584 focos de incêndio por ano. Foi quando, em 2019, atingiu o maior valor da série até então, com 861 focos, aumentando em 2020 para 1.127 focos de incêndio.